Região de Botucatu tem achados arqueológicos de mais de 11 mil anos

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Região de Botucatu tem achados arqueológicos de mais de 11 mil anos 02 outubro 2016

img_7425-4566A região de Botucatu guarda a mais antiga descoberta arqueológica do Estado de São Paulo, com evidências de ocupações de humanos de 11.500 anos, conforme escavações em sítios arqueológicos localizados no município de São Manuel, onde foi habitado por um povo pré-colombiano. Arqueólogos pesquisaram 14 sítios, sendo 11 deles resgatados, totalizando mais de nove mil peças.

O coordenador do projeto, o arqueólogo Paulo Zanettini, afirma que nas escavações no sítio de Caetetuba, em São Manuel, foram encontrados fragmentos de pedra lascada e carvão proveniente de fogueira. A descoberta insere a região numa das rotas iniciais de colonização humana nas Américas. “A antiguidade sugere que os grupos que habitaram a região fazem parte de uma onda mais antiga de imigração que chegou ao continente pelo Estreito de Bering, o conhecido Povo de Luzia”, cita o arqueólogo.

Luzia é o nome do fóssil humano mais antigo encontrado na América no início dos anos 1970, em escavações na Lapa Vermelha, no município de Pedro Leopoldo (MG). O crânio feminino tem cerca de 12.500 a 13.000 anos. Outra importante descoberta na região são gravuras rupestres feitas provavelmente pelos antigos povoadores em seus deslocamentos pelo território explorando os recursos naturais.

A região de Botucatu foi uma rota de chegada dos europeus à América pelo chamado Caminho de Peabiru. Havia um ramal que partia de São Vicente, no Litoral, seguia até Botucatu, onde havia entrocamento de estradas e seguia para o Paraguai ou Peru.

As pesquisas arqueológicas foram feitas neste ano a pedido da Usina São Manoel, porque para obter licença ambiental para a expansão de lavoura nos municípios de Botucatu, São Manuel, Igaraçu do Tietê, Pratânia e Areópolis é necessária a prospecção arqueológica, uma das exigências do Relatório de Impacto Ambiental (Rima).

As escavações ocorreram entre os meses de março, abril e início de maio. Como parte do projeto, foi iniciado na última semana o Programa de Educação Patrimonial Pelos Caminhos da Arqueologia que são palestras, rodas de conversa, exposição de peças e programas de formação dos professores com o objetivo de os resultados arqueológicos serem repassados para clubes de serviços, museus e casas de cultura dos municípios da região. De acordo com a museóloga Aluane de Sá da Silva, o objetivo é “socializar” os resultados das pesquisas arqueológicas. As escolas municipais vão receber material didático sobre o tema.

Teste em fragmento feito nos EUA atesta período da pedra lascada

Amostras de carvão provenientes de fogueira recolhidas nas escavações no sítio Caetetuba têm 11.500 anos, aponta datação em laboratório americano

O sítio Caetetuba, no município de São Manuel, é onde foram encontrados os achados arqueológicos com sinais de presença humana mais antigo do Estado de São Paulo. O laboratório Beta Analytic, dos Estados Unidos, fez a certificação que garante que o material tem 11.500 anos. Na área de 55 mil metros quadrados foram resgatados três mil itens, todos do período da pedra lascada.

“Os materiais resgatados de um dos sítios vieram para São Paulo para estudos em laboratório e obtivemos para nossa felicidade amostras de carvão de fogueira associadas a peças arqueológicas. Essas amostras foram enviadas para os Estados Unidos a um laboratório especializado que nos concedeu a datação absoluta por meio do Carbono 14”, explicou o arqueólogo Paulo Zanettini.

Também foram colhidos materiais mais superficiais, a um metro e sessenta de profundidade, com vestígios de carvão de fogueira com datação de 9 mil anos.

O chefe da equipe de arqueologia ressalta que as duas datações dão mais segurança em obter a data. “O carvão queimado por aquele morador da região há 11.500 anos é o que nos deu a ‘data de aniversário’ do sítio arqueológico”, compara.

Zanettini ressalta que na região tem outros sítios com vestígios de cerâmica, peças polidas e artefatos de pedra lascada um pouco diferente dos antigos com datação de mil anos que coloca a região em outro cenário. “Há também sítios interessantes importante para a história do território que veio a se chamar Estado de São Paulo, contendo outros tipos de utensílios, como cerâmica, peças polidas e artefatos de pedra lascada um pouco diferente desses mais antigos.”

Nos sítios arqueológicos pesquisados há sequência que mostra tanto uma ocupação que remete ao homem do período arcaico até a transição dos períodos do Holoceno para o Pleistoceno.

O Holoceno é o período dado aos 11 mil anos da história da terra, que começa no fim da Era Glacial, ou Idade do Gelo.

O Pleistoceno foi o período quartenário que ocorreu entre 1,8 milhão a 11 mil anos atrás. Esse período é caracterizado pelos mamíferos e de pássaros gigantes.

“Os sítios mais recentes têm cerâmicas com decorações e estilos figurativos que nos mostram grupos com influência tantos dos povos guaranis e de outros povos em convivência na região. Se existe uma riqueza ou uma importância com relação ao passado longínquo também mostra que essa região atraiu muitos grupos e colocou-os em convivência com de diversas etnias no passado”, finaliza o arqueólogo.

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Caminho de Peabiru é uma via de  ligação com os povos da América

O Caminho de Peabiru é um sistema de vias terrestres e fluviais que interligou os povos da América. A rota construída séculos antes da chegada dos colonizadores europeus à América passava pela região de Botucatu.

De acordo com o livro Razias, de Celso e Junko Prado, o caminho tinha 320 quilômetros apenas em território brasileiro, coberto de gramíneas especiais que impediam crescimento de árvores, arbustos e ervas daninhas.

A origem da palavra é incerta, porém, em tupi “Pe” – caminho – e Abyru – gramado amassado. A estrada seria antigos caminhos indígenas, por terra e rios, quase sempre unificados, com lugar de partida para determinado destino.

O arqueólogo Paulo Eduardo Zanettini cita que a via é lendária. “Há evidências e estudos arqueológicos em outras regiões, sobretudo no Paraná, que são verdadeiras estradas pré-históricas. Há toda uma ligação exatamente nesta região onde existem os sítios arqueológicos que são caminhos primitivos pelos colonizadores, bandeirantes, tropeiros e sertanistas, que se valeram por caminhos, picadas e trilhas que já eram utilizadas há mais de 1.000 anos”, conta.

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Pontas de flechas e gravuras rupestres

No mesmo espaço dos sítios arqueológicos foram encontradas dois tipos de ferramentas que não são usais juntas: pontas para lanças, arpões e arco e flecha que, possivelmente, seriam usadas para abates dos mais variados animais. Também nas escavações foram achadas outras ferramentas que se assemelham a plaina. “Essa ferramenta tem um lado plano e outro abauloado, como se fosse uma plaina de desgaste. Pela sua função a gente chama isso como se fosse o ‘canivete suíço’ da pré-história”, compara o arqueólogo Paulo Zanettini.

pecas_em_campo_d-3861As pontas de flechas achadas no Brasil têm características que se diferenciam das localizadas no Estado de São Paulo para o Sul. As plainas, muito típicas no centro-oeste e nordeste, também foram achadas no mesmo sítio na região de Botucatu. “Isso traz uma série de informações instigantes e de hipóteses. Também na mesma área tem um sítio com gravuras rupestres”.

No material de divulgação chama atenção as gravuras esculpidas no arenito feitas possivelmente pelos antigos povoadores em seus deslocamentos pelo território explorando os recursos naturais. “Esse paredão vai ser preservado porque resistiu ao tempo. Os locais já estão sinalizados e demarcados e se conhece pouco desse tipo em São Paulo”, declara Zanettini.

No Estado de São Paulo há 25 sítios rupestres mapeados. Recentemente foi descoberto na Serra do Mar e Bragança Paulista. A inscrição se assemelha a um sol.

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Cerâmica guarani

Durante as escavações também foram identificadas centenas de fragmentos de vasilha de barro. Esse material, conforme testes de laboratório, tem datação de 1.000 anos.

A consultora do projeto, a arqueóloga Camila Wichers relaciona a decoração das peças aos povos Guarani. Há, no entanto, um dos objetos que apresenta um tipo de decoração que remete as outras culturas distintas, apresentando características de povos de outras partes da América do Sul. “Seria uma evidência das trocas realizadas na região? Não sabemos ao certo”, declarou a arqueólogo por meio de nota expedida pela assessoria de imprensa do projeto.

Descoberta é repassada à comunidade

‘Programa de Educação Patrimonial: Pelos Caminhos da Arqueologia’ faz oficinas e exposição itinerante nas escolas da região onde houve as escavações

sam_7994-4547Por exigência legal, toda a descoberta arqueológica deve ser repassada à comunidade. Diante disso, foi desenvolvido o ‘Programa de Educação Patrimonial: Pelos Caminhos da Arqueologia’. De acordo com a museóloga Aluane de Sá da Silva, o objetivo é “socializar” os resultados das pesquisas arqueológicas realizadas nas áreas de expansão da Usina Açucareira São Manoel.

Em parceria com várias instituições educacionais e culturais nos municípios de São Manuel, Botucatu, Pratânia, Areiópolis e Igaraçu do Tietê estão sendo realizadas atividades diversas, como oficinas de formação com educadores das redes municipais e estaduais, rodas de conversas em instituições culturais e museus.

Há também uma exposição itinerante com 30 fragmentos cerâmicas e utensílios de pedras lascadas que estão em três vitrines e quatro painéis do projeto de arqueologia.

Ao todo estão previstas 45 atividades em escolas e instituições culturais, explica Aluane. Na última semana o projeto foi apresentado no Museu do Café na Fazenda Lageado da Unesp de Botucatu, depois no dia 23 de setembro no Clube de São Manuel e no dia 25 no Museu Histórico Pedagógico Padre Manuel da Nóbrega. Em Pratânia, as atividades foram na Casa da Cultura Tonico & Tinoco e há previsão ainda para o dia 8 de outubro no Espaço Cultural Múltiplo Uso, das 9h30 às 11h30, e no mesmo dia no Espaço Cultural Taquara-Pocá, das 13h30 às 17h30.

Na primeira etapa os professores das escolas estaduais e municipais de 5º ao 9º ano de escola de ensino fundamental 2 e do ensino médio recebem o treinamento para serem os multiplicadores nos cinco municípios. O objetivo é repassar os conhecimentos a 350 professores. A intenção é 2.100 estudantes receberem as informações.

O material didático é composto por um livro de 40 páginas “Pelos Caminhos da Arqueologia” com imagens das descobertas repassado aos professores. Já os estudantes recebem o material didático “Arqueologia: uma atividade muito divertida” do Laboratório de Arqueologia Pública da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que será acompanhada do livreto de imagens “Onze mil anos em São Manuel”.

Aluane explica que nas cidades onde têm museu são desenvolvidas em duas etapas as atividades. Primeiramente uma equipe conhece o funcionamento e depois faz o agendamento da exposição itinerante para o público ter acesso. “Priorizamos mais as escolas. A comunidade no geral não teria acesso, mas estamos fazendo também nos museus”, ressaltou.

‘É o mais antigo do Estado’, diz Zanettini

O arqueólogo Paulo Zanettini explica que a datação de fragmentos nos sítios arqueológicos na região de Botucatu é a mais antiga do Estado de São Paulo. “No Brasil temos datações seguras de 30 mil anos e no Mato Grosso 23 mil. Em São Paulo, no entanto, não recuávamos mais de 7 a 8 mil anos”.

“Estas evidências inserem a região numa das rotas iniciais da colonização humana nas Américas. A antiguidade sugere que os grupos que habitavam a região fazem parte de uma onda mais antiga da imigração que chegou ao continente pelo Estreito de Bering, o conhecido ‘povo de Luzia’”, diz o coordenador.

Luzia é o nome do fóssil humano (Homo sapiens) mais antigo encontrado na América, com cerca de 12.500 a 13.000 anos e que reacendeu questionamentos acerca das teorias da origem do homem americano. O nome foi dado pelo biólogo Walter Alves Neves.

Este crânio de uma mulher com cerca de 20 anos foi encontrado no início dos anos 1970 pela missão arqueológica franco-brasileira chefiada pela arqueóloga francesa Annette Laming-Emperaire (1917-1977), de acordo com a Wikipédia. O crânio foi descoberto em escavações na Lapa Vermelha, uma gruta no município de Pedro Leopoldo, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

Fonte: JCNet

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