Asilo é lar de muita gente que já teve um lar

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Asilo é lar de muita gente que já teve um lar 24 abril 2010

Ao todo são 64 pessoas. Dessas 36 são mulheres e 28 homens. A mais nova tem 63 anos e a mais velha 95. A maioria abandonada pela família. Todas distribuídas em 18 casas. Estamos falando do Lar (Asilo) Padre Euclides, que funciona no início da Rua Visconde do Rio Branco, em Botucatu, e para sobreviver recebe verbas do Município, do Estado e da União, além dos colaboradores, voluntários, sócios e parte da aposentadoria dos asilados. Tudo isso ajuda a manter a entidade funcionando, com um mínimo de conforto aos idosos. Alguns, muito lúcidos, outros enfermos e acamados.

Seu presidente é o ferroviário aposentado e taxista João Cláudio Alves, que coordena um quadro de 28 funcionários registrados, que consome boa parte do dinheiro do caixa. Isso sem falar de outros gastos básicos da entidade como água, luz, remédios, alimentação, entre outras despesas.

Se cada uma daquelas pessoas escrevesse o que foi sua vida ao longo desses anos, daria para mais de um livro, com toda certeza. E teríamos em cada livro histórias diferentes, onde não faltaria desalento, amargura, incredulidade, desilusão, ressentimento e, principalmente, abandono.

Conversar com essas pessoas é um privilégio, uma lição de vida e aprendizado.

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Entre elas está Daniel Evaristo, de 68 anos, talvez o mais lúcido dos lúcidos daquela entidade. Ele fala com desenvoltura, convicção e conhecimento. Foi jogador de futebol profissional (goleiro) e passou por times como o Noroeste de Bauru, Juventus, São Bento de Sorocaba e Associação Atlética Botucatuense (AAB). “Estou aqui porque quero. Fazer o que lá fora? Para mim este lugar é o paraíso, não me falta nada. Eu ainda saio passear na rua de vez em quando, mas não costumo ficar muito tempo longe. Meu mundo é aqui”, comentou Evaristo.

Saber da idade da Lázara

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Camargo ou dona Lazinha, foi necessário pesquisar. “Minha idade? Não lembro, mas é bastante!”, disse. Na sua ficha consta 86 anos de idade e 44 no asilo, que a faz a interna mais antiga. Ela se sente em casa e sempre ajuda nos afazeres domésticos. É comum vê-la lavando pratos ou limpando o chão. “Não gosto de ficar parada. Eu sou agitada e só paro pra assistir televisão ou pra dormir”, justifica.

Na gíria, o “namorador” João Leite,

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no auge dos seus 77 anos, poderia ser chamado de figuraço. Alegre e descontraído ele não vacila ao dizer o que mais gostava de fazer na juventude. “Beijar. Gostava muito de beijar. Até hoje eu gosto!”. Sobre o asilo, ele é taxativo. “Eu me acostumei viver aqui e não penso em ir embora daqui. De vez em quando tenho vontade de dar uma saidinha, mas volto logo. Aqui é minha casa”, disse.

Atento ao filme do Mazaropi,

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que passava na televisão de 42 polegadas (doada) do salão principal, Sebastião Rodrigo da Silva, de 86 anos, o Tião, só tirou os olhos da tela quando foi questionado sobre o tempo em que estava na casa. “Não sei quanto tempo, mas depois que a gente chega nessa idade, o tempo não conta mais, não importa”, disse voltando seus olhos para a televisão. Obviamente ele foi deixado em paz, afinal Mazaropi é, infinitamente, muito mais importante do que o repórter.

Um momento marcante foi quando a

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reportagem conversou com Emília Barnabé, com 95 anos de idade, naturalmente debilitada pela idade avançada, mas ainda lúcida. Para se levantar ela foi amparada por um senhor de 62 anos de idade chamado Aparecido. “Vem mãe, fica em pé que o moço vai tirar fotografia”. Aquela mulher de 95 anos estava sendo amparada pelo filho, de 62. Ambos moram juntos ao asilo. A cena foi inesquecível. Foi difícil para o fotógrafo encontrar o “click” da máquina. O repórter não conseguiu dizer nada. Não havia o que dizer.

{n}{tam:16px}Presidente diz que asilo precisa da comunidade{/tam}{/n}

O presidente do Lar Padre Euclides, João Cláudio Alves,

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ressalta que depende do voluntariado e dos colaboradores para manter a Casa funcionando, com condições de dar um mínimo de conforto aos idosos. “Se a gente não tivesse colaboraçãoexterna não sei o que seria, pois o que a entidade recebe com as verbas governamentais não dá para pagar nem os funcionários. Então, precisamos de ajuda e não temos vergonha em pedir. Cito como exemplo meu companheiro Alberto Alves que há muitos anos passa seus finais de semana cuidando dos idosos, fazendo barba, cortando cabelo, dando banho”, colocou Alves.

Um exemplo da colaboração popular está no salão principal que foi inaugurado no ano passado, onde os idosos passam boa parte do dia em frente ? televisão, sentados em sofás. “Foi pedindo aqui, pedindo ali que nós conseguimos construir esse salão e cercar a área externa com muro, pois era muito fácil entrar aqui. Agora nossa próxima etapa é reformar as casas. Pode parecer brincadeira, mas já sofremos furtos aqui. Pessoas entravam e levavam as televisões ou os rádios dos idosos dos quartos. Agora com o muro fica mais difícil entrar”, conta o presidente.

Ele diz que muitas famílias abandonaram seus idosos. “Pode parecer absurdo, mas tem famílias que só vem no asilo quando recebe o comunicado da morte do idoso para buscar o que ele deixou. É triste, mas é verdade. Outros procuram de todas as formas entregar o idoso para o asilo cuidar. A gente aceita qualquer um que queira ficar aqui e que já tenha completado 60 anos, mas o idoso tem que querer ficar. Não é a família que decide isso. Aqui ninguém fica obrigado, pois asilo não é prisão”, frisa o presidente.

Aproveitando a reportagem, Alves ressalta que gostaria que a população tivesse maior participação no asilo. “Eu convido as pessoas para que venham conhecer o asilo, para que conheçam o tratamento que os idosos recebem, que venham conhecer o trabalho que estamos desenvolvendo. Se não puder ajudar tudo bem, mas o calor humano faz bem aos idosos. Quem puder contribuir, venha ficar sócio. A pessoa interessada pode ligar para nosso telefone 3882-2005 ou vir nos visitar qualquer dia da semana. O asilo precisa de todos nós”, finalizou Alves.

Fotos: Fernando Ribeiro

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