Estudos na FMVZ da Unesp de Botucatu buscam a diminuição da dor nos procedimentos em animais

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Estudos na FMVZ da Unesp de Botucatu buscam a diminuição da dor nos procedimentos em animais 31 março 2024

Pesquisador recorre a técnicas de Inteligência Artificial para avaliar a dor em suínos 

Em 2023, foram abatidos no Brasil cerca de 34 milhões de cabeças de bovinos, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Isso equivale a aproximadamente  93.300 abates por dia, ou 3.887 animais mortos por hora. Para os suínos, o total de abates em 2023 foi de 57,17 milhões de cabeças, e em ambos os casos verificou-se um crescimento em relação a 2022, que por sua vez já assinalara também um aumento em comparação com 2021. Mas a maior expansão ocorreu na área de frangos: foram abatidas 6,28 bilhões de aves, o melhor resultado de toda a série histórica iniciada em 1997.

Os números cada vez mais gigantescos movimentados pela indústria de proteína animal no Brasil têm contribuído para fomentar, na academia, a pesquisa sobre as formas mais eficientes para manejar os rebanhos e, também, um interesse pela diminuição do sofrimento dos animais criados em confinamento. Aos poucos, e com o apoio dos estudiosos, o tema do bem-estar animal está ganhando espaço também na indústria, e passando a ser visto, inclusive, como um fator de vantagem comercial.

Alguns desses estudos estão em andamento no câmpus de Botucatu, onde pesquisadores começaram aplicar recursos de Inteligência Artificial para aprimorar escalas de dor em animais que vêm sendo desenvolvidas há anos na Unesp para diferentes espécies. As primeiras escalas foram elaboradas e validadas a partir dos anos 2010, sob a coordenação do professor Stelio Luna, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia. Hoje estão disponíveis escalas para dez espécies, entre animais domésticos e de produção, reunidas no site Animal Pain.

“Animais humanos são capazes de se comunicar e nos ajudar a entender a intensidade da dor que sentem. Para animais não humanos, entretanto, só o que podemos fazer é observar e depois administrar o analgésico”, explica o médico veterinário Gustavo Venâncio da Silva, membro do grupo de pesquisa de Luna. Ele é mestrando no Programa de Pós-graduação em Anestesiologia da Faculdade de Medicina de Botucatu e primeiro autor de um estudo que recorre a técnicas de Inteligência Artificial para simplificar a escala desenvolvida pelo grupo da Unesp para suínos intitulada Unesp-Botucatu Pig Acute Pain Scale – UPAPS. Este é o passo inicial de uma iniciativa que se propõe a revisar as escalas de dor em animais já produzidas em Botucatu. O artigo trazendo o estudo foi publicado este ano em Scientific Reports.

Imagem de vídeo de suínos castrados usado para orientação sobre o uso da escala UPAPS, desenvolvida por pesquisadores da Unesp no campus de Botucatu (Crédito: www.animalpain.org)

Silva trabalhou em parceria com pesquisadores do Laboratory of Applied Artificial Intelligence in Heath (LAAIH), da Universidade Estadual da Carolina do Norte, que é coordenado pelo professor Pedro Henrique Esteves Trindade.  A nova abordagem, além de aprimorar o manejo da dor em suínos, tem o potencial de beneficiar também outros segmentos da indústria, pois pode ser traduzida para outros animais de fazenda. O artigo foi destacado na e-letter semanal da Associação Americana de Veterinários de Suínos.

O veterinário explica que o trabalho foca especificamente a dor pós-castração cirúrgica em suínos, uma vez que esse é um procedimento comum em animais jovens, tanto no contexto de produção quanto em pesquisa. A castração é justificada pelo fato de que animais com altos índices de hormônios são mais agressivos e precisam ser confinados em separado. Isso resulta em aumento dos custos e do estresse do bicho. Além disso, os hormônios também levam a produção de uma carne com forte odor e imprópria para o consumo humano, o que torna esse procedimento obrigatório no Brasil.

De forma simplificada, a escala UPAPS é uma espécie de formulário que avalia diferentes comportamentos do suíno, a partir de cinco itens que devem ser observados pelo médico veterinário: Postura; Interação e interesse pelo ambiente; Atividade; Atenção à área afetada; e Comportamentos diversos. Cada item contém ainda uma série de subitens, de forma que cada observação deve receber uma pontuação entre 0 e 3, no qual 0 representa normalidade ou ausência de dor e 3 indica a dor de maior intensidade. O resultado final vai orientar a administração do analgésico ao animal. “A escala é uma tentativa de padronizar a observação do médico veterinário e fazer com que os animais sintam menos dor ao receberem analgesia da forma apropriada, melhorando assim o seu bem-estar”, diz Silva.

Com o apoio de técnicos veterinários e pesquisadores do Brasil e dos Estados Unidos, que enviaram resultados de suas avaliações, o pesquisador desenvolveu algoritmos que fizeram a ponderação entre as pontuações das escalas e também apontaram modificações que simplificaram a sua aplicação por veterinários.

 “A escalas são criadas por humanos e para humanos. Com as técnicas de Inteligência Artificial, conseguimos avançar na criação de um processo menos enviesado e com maior respaldo estatístico”, diz Silva. A aplicação das técnicas matemáticas permitiu, por exemplo, a exclusão de todo o item Atividade da escala UPAPS sem que isso implicasse perda de qualidade do diagnóstico.

Os resultados do artigo levaram os pesquisadores a questionar se o ganho em simplificação poder ser um fator positivo para ampliar o uso das escalas elaboradas em Botucatu. “Uma versão mais ‘enxuta’ torna a sua aplicação mais simples e pode colaborar para que mais pessoas sejam capazes de usar a escala para a avaliação da dor”, avalia Silva. Nos próximos meses, a expectativa é que novos trabalhos de refinamento das escalas já existentes sejam publicados pelo grupo.

Silva sabe que não é possível fazer com que a indústria deixe de castrar os suínos porque isso traria sérios impactos na produção, e consequências econômicas relevantes. “Então, já que vamos realizar esse procedimento, que seja feito de forma a que o animal seja mais respeitado e sinta menos dor. Enfim, que se valorize o seu bem-estar e se dê a ele um pouco de dignidade”, diz.

Com informações do Jornal da Unesp

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