UTI Pediátrica em Botucatu comemora 35 anos de atividades

Saúde
UTI Pediátrica em Botucatu comemora 35 anos de atividades 31 agosto 2023

Instalada em 1988, a unidade é uma das mais antigas do estado e referência no Brasil

Na sala de reuniões da UTI Pediátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu (HCFMB), local usado para discutir casos e decidir questões fundamentais para o bom andamento dos trabalhos, chama atenção um quadro na parede. Nele, emoldurado está, o prontuário do primeiro paciente atendido pela equipe, em agosto de 1988. A data remete ao início do funcionamento da unidade, que acaba de completar 35 anos de existência.

Uma das primeiras Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) do interior de São Paulo voltada ao atendimento exclusivo de pacientes na faixa etária de 0 a 18 anos, ao longo de três décadas e meia notabilizou-se pelo sólido trabalho nos campos do ensino, pesquisa e assistência à saúde, que a transformou em referência para o Brasil.

Atualmente, a unidade atende crianças e adolescentes gravemente enfermos provenientes do Pronto-Socorro de Pediatria, da enfermaria de Pediatria, demais enfermarias e do Centro Cirúrgico do HCFMB. Além disso, realiza o pós-operatório das diferentes especialidades cirúrgicas, principalmente Cirurgia Pediátrica, Neurocirurgia, Otorrinolaringologia, Ortopedia, Urologia e Cardiocirurgia, sempre que solicitado pela especialidade.

O começo

A ideia de centralizar o cuidado a pacientes mais graves em um único local com objetivo de garantir um monitoramento mais adequado e uma assistência ampliada partiu do médico gastroenterologista e professor Flávio Luís Moreira, responsável à época pela enfermaria de Pediatria. Porém, a proposta esbarrava em um problema: não havia médico intensivista para atendimento.

A solução começou a ser construída com a criação da disciplina de Medicina Intensiva e Emergências Pediátricas e abertura de concurso público para contratação de um docente para ministrar as aulas. O cargo foi ocupado por um jovem médico que durante a residência em pediatria no Hospital Municipal do Jabaquara, em São Paulo, despertou para sua vocação e decidiu trabalhar com urgências e emergências pediátricas: José Roberto Fioretto.

O serviço da capital, chefiado à época pelo Dr. José Oliva Proença Filho, recebia os residentes formados em Botucatu e depois se tornaria principal referência para criação da UTI Pediátrica do HCFMB. “Decidi cuidar das crianças graves lá, com Dr. Proença. Pessoa extremamente capacitada, ágil, agregadora. Hoje é um grande amigo. E o mais interessante é que depois que criamos a UTI aqui em Botucatu, os residentes do Dr. Proença passaram a vir para cá”, lembra Fioretto, atual chefe acadêmico/assistencial e considerado o grande responsável pela consolidação da unidade.

O início dos trabalhos não foi fácil. O docente diz que quando a UTI começou a funcionar ainda não estava oficialmente contratado. Houve um problema na reitoria da Unesp que impedia a assinatura do seu contrato.

“Eu já havia deixado de ser residente e não era oficialmente professor. Fiquei sem ganho financeiro por quase dez meses. Quem desenrolou essa situação foi o Dr. Herculano Dias Bastos”, relembra.

Por seis meses, ele e o professor Flávio ficaram responsáveis pelos plantões, até que fosse formada a primeira equipe de profissionais, que incluiu os doutores Rossano César Bonatto, Martim Alves Ferreira e Eduardo Bicas Franco. “O hospital ainda não tinha dinheiro no orçamento para pagar pelos plantões. Ficamos um ano e meio sem receber nada. Nós dormíamos numa cama de montar do Dr. Flávio no Departamento de Pediatria porque sequer tínhamos quarto de plantão. Até a roupa de cama trazíamos de casa. Assim foi o começo”, comenta Fioretto. 

Os pacientes eram atendidos em um quarto pequeno da enfermaria, onde cabiam três a quatro crianças, no máximo. A transferência para a área física atual, com capacidade para 12 leitos, aconteceu em junho de 2002. “Naquele tempo não tínhamos rede de oxigênio e ar comprimido nas paredes do hospital. Cada criança que estava entubada precisava de quatro torpedos. Eram dezesseis torpedos dentro de um quarto de plantão. Vendo aquela situação, o Dr. Pádua (Antonio de Pádua Campana) me dizia: ah, menino, só te benzendo mesmo. Isso aqui vai explodir qualquer dia. Esse foi o embrião de tudo que temos hoje”, brinca Fioretto. 

O professor também faz menção especial ao trabalho das equipes de enfermagem que não mediram esforços para prestar o melhor atendimento aos pacientes, desde o início dos trabalhos da UTI Pediátrica.

“Sem o pessoal de enfermagem não dá para o médico fazer nada. Eles também foram guerreiros. Dobravam o serviço atendendo a enfermaria e a UTI sem nenhum ganho adicional. Somente por volta de 1991, a supervisão do hospital reconheceu e compôs o corpo de enfermagem para a UTI especificamente, como temos até os dias de hoje”, ressalta.

Evolução

Consolidada ao longo de 35 anos de trabalho, a UTI Pediátrica do HCFMB hoje é reconhecida como uma das mais importantes do país, pelo volume de atendimento, índice de recuperação de pacientes, pesquisas que desenvolve e nível dos profissionais que forma.

A unidade trabalha com diversos indicadores para avaliação constante da qualidade dos serviços, entre eles: tempo de internação, número de pneumonias que se associam a ventilação mecânica, frequência de úlceras de decúbito (feridas quando paciente fica deitado), infecções por cateter, número de quedas de cama, volume de reinternação, entre outros.

Fioretto também destaca que sua instalação permitiu à FMB criar a Residência Médica em Medicina Intensiva Pediátrica, oferecida anualmente com cinco vagas de ingresso a partir de exame de Residência Médica, com duração de dois anos. “Fui preceptor dos residentes durante vinte e cinco anos. Credenciamos a UTI como centro formador junto a Associação de Medicina Intensiva Brasileira. Já formamos mais de 170 residentes ao longo desse tempo. O Brasil inteiro tem residentes formados aqui. Isso para nós é um orgulho imenso”, comenta o docente. 

A unidade hoje dispõe de 10 leitos para internação e dois leitos de isolamento. Conta com o trabalho de uma equipe multiprofissional que inclui cinco médicos diaristas, 13 médicos plantonistas, profissionais de enfermagem, fisioterapeutas, psicólogos, nutrólogos, odontologistas, assistentes sociais, farmacêuticos, agentes de limpeza e manutenção. O chefe administrativo da unidade é o Professor Fábio Joly Campos, o chefe acadêmico/assistencial é o Professor José Roberto Fioretto e a enfermeira-coordenadora é Amanda Fabíola de Oliveira Spadotto. Mensalmente, a unidade atende cerca de 50 pacientes.

Futuro

Para Fioretto, o principal desafio para a UTI Pediátrica nos próximos anos será a capacidade em dar resposta às mudanças epidemiológicas das doenças que acometem crianças.

“Quando comecei a fazer UTI o que mais levava crianças à internações era diarreia grave que se transformava no choque séptico, na infecção sistêmica. Isso estava ligado as questões de falta saneamento básico e a não existência do soro de reidratação oral, um divisor de águas na mortalidade pediátrica. Foi havendo uma mudança epidemiológica e hoje a prevalência maior é de doenças respiratórias virais”, explica.

Diante dessa nova realidade, o período de março a setembro é considerado o mais crítico para o serviço, pela elevação da circulação dos vírus que fazem aumentar consideravelmente as internações por doenças como influenza e bronquiolite. O cenário tem feito com que os responsáveis pela unidade trabalhem pela ampliação das instalações físicas, principalmente das áreas de isolamento.

“Precisamos de muita estrutura de assistência respiratória. Nossa capacidade atual não é mais suficiente porque hoje em dia os isolamentos em pediatria são essenciais e temos apenas dois. Quando eles estão ocupados, as crianças têm que aguardar no Pronto Socorro porque não temos onde acomodá-las. Estamos em entendimentos com a superintendência do hospital para mudar a UTI para uma área maior”, explica Fioretto.

Revisitar os fatos que contribuíram para a criação e consolidação da UTI Pediátrica arranca sorrisos do professor, que se sente reconfortado pela sensação de dever cumprido.

“Estamos falando de trinta e cinco anos. É uma aventura e quando você está no meio dela nem percebe. No momento em que fazemos uma retrospectiva, cai a ficha de tudo que vivemos. Ainda passo visita aqui, me reúno com meus residentes muito feliz. Dou minhas bronquinhas ainda. Era famoso por minhas broncas. É uma trajetória vivida. Vir aqui me realiza, tenho sensação de dever cumprido”, conclui.

Fonte: FMB/Unesp

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