A Unesp, juntamente com universidades da Itália e da Holanda, teve projeto aprovado para financiamento pelo Humans Frontiers Science Program (HFSP), uma das chamadas mais concorridas da Europa. A proposta ficou em quinto lugar entre as 21 aprovadas. Das 1.073 cartas de intenção enviadas inicialmente, apenas 78 foram selecionadas para a segunda fase (submissão da proposta completa) e, dessas, 21 foram aprovadas, ou seja menos de 3% das que se candidataram inicialmente.
A chamada multidisciplinar, aberta para pesquisadores de todo o mundo, prevê um processo de interação internacional entre os grupos de pesquisas envolvidos. O projeto vai focar inicialmente em Zika e depois Dengue, num processo chamado imunidade transgeracional, ou seja, o estudo da imunidade que é passada de uma geração para outra de mosquitos.
“Vamos investigar essa hipótese. A ideia geral é que, quando o vírus infecta um mosquito, transfere para o genoma dele um pedaço do genoma viral. E esse fragmento do material genético viral, chamado de NIRV (non-retroviral integrated RNA virus sequence), que passa a integrar o DNA do mosquito, é usado pelo próprio inseto para produzir moléculas que combatem o vírus quando ele é infectado novamente. Uma vez que o NIRV integrado ao genoma do inseto é específico para cada tipo de vírus que o infecta, nosso trabalho pode gerar a primeira evidência de que insetos também possuem uma resposta imune adaptativa, além da sua já tradicional e caracterizada resposta inata contra patógenos. Vamos investigar se isso de fato acontece e qual é o mecanismo que rege esse processo”, diz Jayme A. Souza-Neto, que lidera o Laboratório de Genômica Funcional e Microbiologia de Vetores (Vectomics), vice-Coordenador Executivo do IBTEC (Instituto de Biotecnologia) da Unesp e professor da Faculdade de Ciências Agronômicas (FCA) da Unesp de Botucatu.
Souza-Neto informa ainda que a proposta não podia ser feita baseada em colaborações que existiam anteriormente e que os pesquisadores necessariamente precisavam fazer algo diferente do que vinham realizando até então. “Foi necessário, portanto, propor atividades com base nas expertises de cada um, mas que fossem, porém, diferentes daquelas em rotina nos nossos laboratórios, e que de forma clara representassem a formação de um novo plano pesquisa para cada grupo. É uma grande oportunidade para incorporarmos novas tecnologias e expandir a linha de pesquisa do Vectomics, e ainda em parceria com dois jovens e promissores grupos de pesquisa europeus”.
No projeto, portanto, as atividades serão igualmente divididas, não havendo diferença de importância entre o que será feito no Brasil, na Itália e na Holanda. O fluxograma de atividades proposto aponta para uma grande interação e troca de dados entre os grupos envolvidos. Participam do projeto como co-coordenadores os Profs. Ronald van Rij (Radboud University Medical Center, Holanda) e Mariangela Bonizzoni (Universidade de Pavia, Itália).
O grupo liderado pelo professor da Unesp estará envolvido em todas as etapas do projeto, que vão da identificação à validação das NIRVS no mosquito, mas principalmente com ensaios no mosquito adulto, incluindo a geração de mosquitos geneticamente modificados, para avaliar o provável efeito antiviral das NIRVs. Os outros grupos atuarão também em ensaios de bioinformática para analisar a sequência do DNA do mosquito, o que deve ser feito na Itália, e ensaios antivirais com as NIRVS em culturas celulares de mosquito, o que deve ser feito na Holanda. “O sucesso desse trabalho vai depender de uma sintonia muito grande entre os grupos. Não se trata de juntar pesquisas paralelas, mas de uma ação bem integrada em sinergia”, comenta o pesquisador do IBTEC.
A parte realizada no Brasil será feita no laboratório do IBTEC em Botucatu. Serão utilizadas as instalações de segurança já existentes para infectar mosquitos e manipular o vírus e o inseto infectado, além da estrutura biomolecular de injetores e bioinjetores microscópicos para manipular embriões e gerar mosquitos geneticamente modificados, estruturas previamente adquiridas com o apoio da FAPESP através de um auxílio a Jovens Pesquisadores em Centros Emergentes concedido a Souza-Neto em 2013.
“A expectativa é grande. Já conhecia os pesquisadores europeus pela leitura de suas publicações na área, mas foi por meio de um colega, pesquisador da Califórnia, EUA, que os contatos iniciaram, no momento em que a Profa. Bonizzoni buscava um parceiro no Brasil para estudar a imunidade transgeracional adaptativa de mosquitos a arbovirus. Assim iniciamos a parceria que hoje se consolida”, mencionou Souza-Neto.
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