O Departamento de Horticultura da Faculdade de Ciências Agronômicas (FCA), da Unesp de Botucatu, faz um amplo trabalho de pesquisa para avaliar o comportamento do cultivo de uvas em quatro regiões do Estado, duas delas em Botucatu e São Manuel.
O projeto tem financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Os dados levantados são resultado da pesquisa de três alunos de doutorado – Ana Paula Maia Paiva, Francisco José Domingues Neto e Marlon Jocimar Rodrigues da Silva – que vão defender teses no programa de pós-graduação em agronomia e horticultura da FCA.
O cultivo de uva tem sido feito em áreas experimentais da Unesp para avaliar o tipo de uva na elaboração de vinhos ou sucos. O trabalho científico vai fornecer informações para o aprimoramento do setor de viticultura paulista, com previsão de terminar em 2020.
No Estado a maior produção de uva são nas regiões de Jundiaí e Jales. Apesar da reduzida área de plantio e de produção na região de Botucatu equivalente a 0,32% da produção estadual, o professor Marco Antonio Techhio, do Departamento de Horticultura da Faculdade de Ciências Agrônomica (FCA) da Unesp de Botucatu, justifica a pesquisa porque há demanda crescente pelos produtores no plantio no entorno de Botucatu, São Manuel e Lençóis Paulista, além do cultivo da videira ser uma boa alternativa.
Há desafios a ser enfrentados nesse setor. Ainda há alto custo de produção decorrente da grande demanda de mão de obra e de insumos, associado aos baixos preços na comercialização. Essa reclamação é possível de ser ouvida de produtores ouvidos pelo JC. É o caso de Paulo Nagata, de Botucatu, que produziu por 30 anos uva para vender em entrepostos e admite que está “desistindo”. Atualmente mantém uma pequena área. “Não compensa financeiramente”, contou.
A proprietária do Sítio Rocinha, onde está instalada a Vinícola Casagrande de Lençóis Paulista, Marisa Gorethi Vieira Machado Casagrande, também cita que é um tipo de cultura agrícola que exige “mão de obra” especializada e tem custo alto. No caso dela, é uma herança de quatro gerações. Os seus avós decidiram manter a tradição de cultivar uva para fazer vinho no sítio.
Uva para fazer suco tem demanda
A uva tanto pode ser cultivada para a produção de vinho, na venda ao consumidor ou na produção de suco, segmento que vem crescendo no país. O Brasil é o único no mundo que existe a produção de suco integral sem aditivos químicos. Em 2014 foram vendidos mais de 90 milhões de litros de suco de uva prontos para consumo, 13,5% a mais que no ano de 2013. O interesse do brasileiro por alimentos saudáveis despertou no consumidor deixar o refrigerante para um segundo plano e procurar mais sucos naturais.
A pesquisa da Faculdade de Ciências Agronômicas (FCA), da Unesp de Botucatu, visa avaliar qual é o tipo de variedade melhor para a produção de uva.
O estudo é mais amplo por incluir as regiões de Jundiaí e Jales, dois importantes polos vitícolas, respondendo com 65% da produção da uva Niagara Rosada. Devido a queda de rentabilidade dessa variedade, uma das alternativas é a diversificação de cultivares e a elaboração de suco e vinho para a agregação de valor à uva, explica o coordenador da pequisa do Departamento de Horticultura da FCA, Marco Antonio Tecchio.
“O grande problema de produção de uva no Estado de São Paulo é que a safra é feita no verão – dezembro e janeiro época que chove bastante. Como essas variedades apresentam uma moderada resistência a doenças fúngicas até que elas aguentam um pouco de chuva na colheita. No caso de uvas finas europeias são mais sensíveis e tem o cultivo dificultado”, explica o professor.
A pesquisa feita em Botucatu avalia o comportamento do cultivo de uvas para elaboração de vinhos ou sucos, como a Bordô, Isabel, Isabel precoce, Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Merlot, Syrah e Sauvignon Blanc, além de programas de melhoramentos genéticos do Instituto Agronômico de Campinas e da Embrapa.
Nos campos experimentais tanto de São Manuel como Botucatu foram plantadas algumas variedades para que fosse feita pesquisa de campo.
De acordo com o coordenador, após a poda foram avaliadas, semanalmente, as diferentes fases do ciclo da videira, tendo por finalidade auxiliar o viticultor no manejo de técnicas culturais. Durante a colheita, a equipe investigou os aspectos produtivos e de qualidade da uva, como produtividade e dimensões de cachos e bagos de uva.
O estudo também inclui as regiões de Votuporanga e Jales. Nesses locais a produção é de uva Itália complementada pelas mutações Rubi, Benitqaka, Brasil e Redimeire. De acordo com o pesquisador, mais recentemente tem o cultivo de uvas sem sementes BRS Vitória, lançadas pela Embrapa.
Resultados
Os primeiros resultados das pesquisas na unidades experimentais da Unesp têm demonstrado que algumas variedades são boas para a produção de suco.
No caso de São Manuel, por exemplo, o professor Marco Antonio Tecchio cita que quanto a qualidade química da uva testada com potencial para a elaboração de sucos foram os cultivares BRS Violeta, BRS Cora e BRS Carmem, com produtividade acima de 20 toneladas/ha.
Região não tem tradição no cultivo de uva
A região ainda tem um reduto forte de produção de cana, eucalipto e laranja. O plantio de uva geralmente ou é uma tradição de antigos produtores de descendência italiana que vem de várias gerações ou em pequena escala.
Há uma explicação para isso: a viticultura exige mão de obra especializada. O manejo é muito intensivo. Para cada 1 hectare com seis a sete mil plantas são necessárias duas a três pessoas bem treinadas. “Por não ser uma região de muita tradição no cultivo na uva, o que se recomenda é o produtor começar com área pequena e ir aumentando a produção conforme for pegando prática com a cultura. É, na verdade, um trabalho manual mesmo, com pouca possibilidade de mecanização”, explica o professor Marco Antonio Tecchio.
A cultura demora no método convencional dois anos e meio contando o plantio até a primeira colheita. “Pode-se comprar muda enxertada para reduzir esse período, mas o retorno financeiro é um pouco demorado. O custo de implantação é relativamente caro”, explicou o professor.
Tradição garante produção de vinho
A produção de vinho em Lençóis Paulista tem 126 anos de tradição. É artesanal em pequena escala, a uva é plantada na própria propriedade, onde o vinho é produzido e guardado em tonéis de carvalho ou em aço inoxidável. A venda ocorre na própria Vinícola Casagrande no sítio Rocinha, no quilômetro 111 na rodovia Osni Mateus (SP-261), onde tem uma loja (abre de terça a domingo) e restaurante (que funciona aos domingos). Atualmente a família que toma conta está na quarta geração. O local é uma agroindústria, com atividade de turismo rural. Essa foi a forma que os atuais proprietários encontraram para continuar a manter a tradição que vem dos antepassados italianos e manter o negócio viável financeiramente.
Mas não é só vinho que é a especialidade da casa. O suco de uva também vem sendo engarrafado com boa aceitação no mercado. Essa é uma nova tendência dos produtores de uva para agregar mais valor, tendência que a Vinícola Casagrande adotou nos últimos três anos.
A proprietária Marisa Gorethi Vieira Machado Casagrande junto com o marido, que é engenheiro agrônomo, administra toda essa estrutura. Como ela própria recorda é uma herança italiana o plantio da uva. “Vem desde 1889. O nonô quando chegou em Lençóis, trouxe o hábito de ter seu vinho próprio. Sempre plantaram uva”, conta.
A rigor, nos antepassados essa produção vinícola atendia mais uma produção caseira para a família sem objetivos financeiros. A partir de 1989 é que virou uma vinícola.
No sítio já teve plantio de arroz e depois se voltou para a cana-de-açúcar nos anos 40. “Nunca deixou de plantar uva para garantir a produção de vinho o ano todo”, conta a proprietária.
A atividade de vinícola foi aos poucos se expandindo. Marisa conta que não havia estrutura para receber as pessoas que procuravam o local para visitar. A partir de 2006, começou a abrir o sítio para visitação ao público, numa espécie de turismo rural.
O vinho é produzido com uvas de variedades desenvolvidas para a região. Não são do tipo europeia. “As uvas de variedade para a área resistem mais ao clima, um pouco quente”, conta Marisa, em frente das videiras que ficam a alguns metros da margem do Rio Lençóis próximo de toda a estrutura. A Vinícola Casagrande é um turismo enogastronômico com casarão da vinícola, visitação da adega e loja de vinhos artesanais. No local tem fabricação artesanal de presunto tipo Parma Italiano. O restaurante funciona aos domingos, a partir de 11h30. Informações (14) 99661-4658.
Fonte: Aurélio Alonso – Jcnet/Bauru
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