No Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, órgão lembra que nos dois últimos anos recebeu 22 denúncias no centro-oeste paulista
Nesta sexta-feira (28) é comemorado o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, data instituída com o objetivo de ampliar a visibilidade sobre o tema, alertar sobre a importância das denúncias feitas pela população, e discutir ações do poder público para eliminar esse tipo de trabalho.
Apesar de parecer um assunto de séculos passados, muitos trabalhadores ainda são submetidos a condições degradantes. Prova disse é que a Regional de Bauru (SP) da Procuradoria do Ministério Público do Trabalho (MPT) investiga 11 processos relacionados ao trabalho análogo à escravidão, tráfico de trabalhadores e trabalho indígena (veja lista abaixo).
Nos anos de 2020 e 2021, a Procuradoria, que responde por cerca de 100 municípios nas regiões de Bauru, Botucatu, Marília e Ourinhos, recebeu 22 denúncias sobre o tema.
Entre os casos investigados, estão alguns de condições sanitárias precárias, problemas com jornada exaustiva de trabalho, irregularidade em contratos trabalhistas e exploração de crianças e adolescentes.
De acordo com o vice-coordenador da Coordenadoria do Enfrentamento ao Trabalho Escravo da Procuradoria do MPT de Bauru, Marcus Vinicius Gonçalves, as condições degradantes de trabalho colocam em risco a saúde e segurança do trabalhador e ignoram o cumprimento dos direitos básicos trabalhistas e previdenciários.
“Entre as condições observadas estão a falta de registro de contrato de trabalho, situações em que o trabalhador fica em alojamento sem a menor condição de habitação, não é fornecido equipamento de proteção individual, não tem local pra fazer as refeições no campo, não é fornecida água potável e o trabalhador é transportado em veículos impróprios ou conduzidos por pessoa não habilitadas”, diz o procurador.
O artigo 149 do Código Penal Brasileiro diz que trabalho análogo à escravidão trata-se de “reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador”.
A pena prevista é de reclusão de dois a oito anos, multa e possibilidade de pena correspondente à violência cometida.
As penas referem-se também a ocasiões em que há vigilância no local de trabalho ou o empregador se apodera dos documentos e objetos pessoais do trabalhador para segurá-lo no local. A pena é aumentada se o crime é cometido contra criança ou adolescente ou por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.
Casos investigados pela Procuradoria em Bauru:
- Cidade: Pardinho
Investigação: condições sanitárias, jornada, contrato de trabalho e remuneração
Data da autuação: fevereiro de 2021 - Cidade: Pederneiras
Investigação: condições sanitárias, jornada, contrato de trabalho, remuneração
Data da autuação: fevereiro de 2021 - Cidade: Campos Novos Paulista
Investigação: condição degradante
Data da autuação: março de 2021 - Cidades: Campos Novos Paulista e Ocauçu
Investigação: condição degradante
Data da autuação: março de 2021 - Cidades: Campos Novos Paulista e Ocauçu
Investigação: condição degradante
Data da autuação: abril de 2021 - Cidade: Assis
Investigação: condições sanitárias, exploração trabalho de criança e adolescente, contrato de trabalho
Data da autuação: maio de 2021 - Cidades: Águas de Santa Bárbara, Botucatu e Itaí
Investigação: condição degradante
Data da autuação: abril de 2021 - Cidade: Paranapanema
Investigação: condição degradante e jornada
Data da autuação: junho de 2021 - Cidade: Porangaba
Investigação: servidão por dívida, remuneração
Data da autuação: setembro de 2020 - Cidade: Procedimento sigiloso
Investigação: condições degradantes
Data da autuação: março de 2021 - Cidade: Procedimento Sigiloso
Investigação: condições degradantes
Data da autuação: março de 2021
Prisão na região
Em 2021, a polícia prendeu um dos condenados por manter trabalhadores em situação análoga à escravidão em uma carvoaria em Pirajuí (SP), entre 2007 e 2008.
Na ocasião do flagrante, foram resgatadas dez vítimas que eram submetidas a condições degradantes e jornadas exaustivas de trabalho. Segundo a denúncia, os trabalhadores não recebiam salários e viviam em alojamentos, sem as mínimas condições de higiene.
De acordo com o procurador, nos municípios da região de Bauru tem sido comum o enquadramento de trabalho análogo à escravidão tanto no meio rural quanto na área urbana.
Normalmente as situações de exploração são vistas em propriedades da zona rural em culturas de mandioca, cana-de-açúcar, laranja e, no meio urbano, na construção civil e em oficinas de costura.
“Geralmente as vítimas são migrantes nordestinos e estrangeiros como paraguaios, venezuelanos, haitianos e bolivianos. Trabalhadores que normalmente estão no país de forma ilegal e dificilmente denunciam situações de exploração com receio de serem descobertos e mandados pra fora do Brasil”.
MPT incentiva denúncias
O Ministério Público do Trabalho pede o apoio da população para fazer as denúncias de situações de exploração do trabalho, uma vez que muitos casos acontecem em locais de difícil acesso e sem conhecimento do poder público.
Depois que a denúncia é feita, uma equipe de fiscalização vai até o local para conversar com os trabalhadores, colher depoimentos, tirar fotos e verificar o ambiente de trabalho. Em seguida, tudo é documentado para seguir com os procedimentos previstos em lei para punir os responsáveis.
“O Ministério Público do Trabalho vai cobrar do empregador o pagamento de indenizações ou o registro do contrato de trabalho. Inclusive se for verificado trabalho escravo e o explorador estiver no local pode haver a prisão em flagrante dele. Isso vai gerar um processo criminal com uma denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal”, explica o procurador.
Tragédia gerou data nacional
O Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo foi criado em 2009 para homenagear três auditores fiscais do trabalho e um motorista que foram assassinados em 28 de janeiro de 2004 durante uma inspeção para apurar a denúncia de trabalho escravo em fazendas da região de Unaí (MG). O caso ficou conhecido nacionalmente como a “Chacina de Unaí”.
De acordo com dados da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério da Economia, entre 1995 e 2020, mais de 55 mil pessoas foram libertadas de condições de trabalho análogas à escravidão no país.
Quatro fiscais do Ministério do Trabalho foram mortos em 2004, na Chacina de Unaí — Foto: Reprodução/TV Globo
O procurador Marcus Vinicius Gonçalves diz que esse trabalho conjunto entre os órgãos públicos e a população é fundamental para promover o resgate desses trabalhadores que muitas vezes não percebem que estão sendo submetidos à condições exploradoras de trabalho.
“Além disso, é importante dizer que o trabalho de investigação pode responsabilizar toda a cadeia produtiva que está por trás da exploração, inclusive as propriedades rurais que podem ser objeto de desapropriação”, explica.
Como denunciar?
As denúncias podem ser feitas de forma anônima diretamente no prédio da Procuradoria do Ministério Público do Trabalho, acionando outros órgãos como a Polícia Militar, a Polícia Federal ou o Conselho Tutelar e também por telefone, site ou e-mail.
- Endereço: Rua Júlio de Mesquita Filho – 10-31 – Jardim Panorama – Bauru
- Telefone: (14) 3214-3611
- E-mail: [email protected]
- Site: www.prt15.mpt.mp.br
Fonte: G1
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