Deputado também levou testemunhas que não presenciaram episódio em que foi flagrado passando as mãos no seio da deputada do PSOL, em dezembro. Deputada Isa Penna considerou conteúdos dos depoimentos uma ‘continuação da violência’.
O deputado estadual Fernando Cury (Cidadania) depôs nesta quarta-feira (24) no Conselho de Ética da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), em processo no qual é acusado de importunação sexual pela deputada Isa Penna (PSOL). Câmeras da Casa registraram o parlamentar colocando a mão no seio da deputada.
Ele voltou a negar o crime e argumentou que se tratou apenas de um “gesto de gentileza” ao interromper a conversa que a deputada estava tendo com Cauê Macris (PSDB), presidente da assembleia.
“O abraço que eu dei na deputada Isa Penna foi um gesto que eu quis fazer de gentileza, justamente porque eu ia interromper uma conversa que ela estava tendo com o presidente Cauê Macris”, disse ele.
“Gesto esse, no meu entendimento, completamente sem maldade, completamente sem segundas intenções, um gesto que não teve qualquer conotação de intenção sexual, mas que a deputada Isa Penna, no seu direito, evidentemente, considerou constrangedor e ofensivo”, continuou ele, acrescentando um pedido de desculpas à deputada, aos colegas da Alesp e pedindo um julgamento justo.
Adiante na sessão, ele citou os deputados que abraçou naquela noite, e destacou André do Prado (PP), a quem ele também teria “abraçado por trás”.
Em dezembro, o deputado Fernando Cury foi flagrado passando a mão no seio da deputada Isa Penna no plenário da Casa. Há 15 dias, os deputados do Conselho de Ética votaram favoravelmente ao recebimento da denúncia e abriram o processo.
Ainda na sessão desta quarta-feira, o parlamentar afirmou que o episódio já lhe trouxe aprendizados sobre a necessidade de moderar o “seu jeito”.
“Ainda que tenha sido um abraço, que tenha constrangido a deputada Isa Penna, e que seja meu jeito, me traz muito aprendizado. Esse meu jeito, hoje, não é tolerado por grande parte das pessoas, que podem se sentir ofendidas através desse gesto, desse carinho, de um abraço, de um beijo. A partir de hoje preciso rever esse comportamento porque, como disse, muitas pessoas se sentem constrangidas com isso”, disse Fernando Cury em depoimento.
A deputada Erika Malunguinho (PSOL), integrante do Conselho de Ética, perguntou o que o deputado tratava com o colega Alex de Madureira (PSD), que tentou contê-lo momentos antes de ir em direção a Isa Penna. Cury respondeu que falavam de assuntos diversos, inclusive não ligados ao mandato, mas que a tentativa de segurá-lo ocorreu quando ele queria pedir ao presidente da Alesp que acelerasse uma votação.
Ele ainda levou ao Conselho de Ética da Alesp oito testemunhas que não presenciaram os fatos, entre colegas de faculdade e de trabalho, e um perito. Nenhuma destas testemunhas considerou que o episódio se tratava de importunação sexual.
Isa Penna também esteve presente na reunião virtual e pediu a palavra ao final da sessão. “Eu não prestei depoimento: faço esse pedido aos colegas. Isso que aconteceu hoje é uma continuação da violência. Peço que eu seja ouvida, interrogada, reforço o pedido de perícia e da oitava dos deputados, em especial Teonilio Barba (PT), Cauê Macris, Carlão Pignatari (PSDB) e Gilmaci Santos (PRB). Já estou fazendo este requerimento”, disse ela.
De acordo com ela, os parlamentares citados presenciaram a cena e alguns deles inclusive lamentaram o episódio naquele mesmo momento.
O que disseram as testemunhas de defesa
As sete mulheres convidadas se identificaram como amigas de Fernando Cury e relataram que nunca souberam do envolvimento do deputado em casos de importunação sexual. De acordo com elas, o parlamentar é conhecido por ser uma pessoa “carinhosa e amorosa” e não viram assédio no vídeo com Isa Penna.
As testemunhas também afirmaram que o fato de Isa Penna e Fernando Cury serem colegas de trabalho, não são completos desconhecidos, o que também derrubaria a tese da importunação sexual.
Já o perito Edmundo Braun, que periciou o vídeo a pedido da defesa do deputado, disse que não há possibilidade de afirmar se houve ou não o toque, mas disse que não houve assédio, inclusive baseando-se em uma suposta demora que ele considerou ter tido entre a aproximação de Cury e a reação dela.
Na sequencia, o deputado Barros Munhoz (PSB) disse que “está faltando uma perícia”, pois, para o parlamentar, faltou a análise do momento em que Cury se dirige ao deputado Alex de Madureira, que faz um gesto para segurá-lo. “Por que quis segurar? O que o Fernando Cury disse? Esse é o cerne do problema. Precisamos de um perito contratado pelo Conselho para completar seu brilhante trabalho, doutor. Houve um fato grave, que precisa ser apurado”, afirmou.
Participaram da sessão os seguintes deputados, integrantes do conselho:
Maria Lúcia Amary (PSDB)
Emidio de Souza (PT)
Barros Munhoz (PSB)
Erica Malunguinho (PSOL)
Delegado Olim (PP)
Alex de Madureira (PSD)
Estevam Galvão (DEM)
Wellington Moura (Republicanos)
A próxima reunião do Conselho de Ética para discussão do caso foi marcada para segunda-feira (1), em que serão ouvidos Isa Penna, Alex de Madureira, Teonilio Barba, Coronel Telhada e Gilmaci Santos. Fernando Cury também poderá participar novamente.
Após estes depoimentos, o deputado Emidio de Souza, relator do caso indicado pela presidente do conselho, a deputada Maria Lúcia Amary, deverá elaborar um parecer em até 15 dias. Caso eles definam por uma condenação, o caso será enviado para o plenário da Alesp.
Na reunião desta quarta, os integrantes do conselho também deliberariam sobre a admissão de uma segunda representação contra Fernando Cury oferecida ao comitê pelas deputadas Professora Bebel (PT), Márcia Lia (PT) e Marina Helou (Rede) por quebra de decoro parlamentar no episódio com Isa Penna.
No entanto, a deputada Marina Helou informou que ela e as deputadas, procuradoras da Mulher, decidiram suspender a representação devido ao já acolhimento da denúncia de Isa Penna. De acordo com ela, o ato pretendia fortalecer o pleito da deputada do PSOL.
Outras investigações sobre Fernando Cury
Além do processo correndo no Conselho de Ética, Fernando Cury é alvo de uma investigação criminal aberta pelo Ministério Público de São Paulo e autorizada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, que autorizou a abertura da investigação, já que todo parlamentar tem foro privilegiado em São Paulo.
No pedido de investigação, a promotoria informou que “os fatos, em uma preliminar análise, podem ter contornos de infração criminal” e de “crime contra a liberdade sexual”, precisando, portanto, de “abertura de investigação criminal para a oitiva das testemunhas indicadas com a finalidade de angariar elementos de elucidação dos fatos”.
O deputado estadual também é alvo de um processo disciplinar no partido dele, o Cidadania. Fernando Cury foi afastado das funções dele no partido em 18 de dezembro, após a repercussão do caso.
O Cidadania considerou que o episódio de importunação sexual na Alesp foi “desrespeitoso, afrontoso e deve ser combatido”, e o Conselho de Ética da legenda recomendou ao diretório nacional a expulsão do parlamentar do partido.
A expulsão de Cury seria decidida na reunião do diretório nacional no dia 13 de janeiro, mas o encontro foi suspenso porque ele conseguiu uma liminar na Justiça de Brasília para suspender o processo interno.
A juíza Thassia de Moura Guimarães, da 20º Vara Cível de Brasília, entendeu que o processo contra o deputado deve ser primeiro direcionado ao conselho de ética no âmbito estadual do Cidadania em São Paulo. Depois disso é que ele deve ser analisado no âmbito nacional.
Apesar da liminar favorável, Cury continua afastado das tarefas do partido, incluindo a de liderança da sigla na Alesp.
Fonte: G1