Deputados estaduais de São Paulo gastaram, em três anos, R$ 15,5 milhões com gráficas, aponta levantamento do SP1. O serviço é responsável pela maior parte da verba de gabinete dos parlamentares da Assembleia Legislativa paulista.
Cada um dos 94 deputados pode gastar até R$ 8 mil por mês com serviços gráficos, que incluem jornaizinhos e boletins informativos –uma forma de os parlamentares prestarem conta do próprio trabalho. Os gastos entre 2015 e 2018 foi superior ao valor destinado a alugueis de imóveis e combustível.
30 gráficas
Dos R$ 15 milhões gastos com gráficas, metade ficou na mão de trinta empresas. Por meio da Lei de Acesso à Informação, foi possível comprovar que notas e boletins impressos de vinte gráficas foram entregues. Outras dez e não comprovaram a execução do serviço.
A produção do SP1 analisou mais de 700 notas fiscais das trinta gráficas que mais receberam dinheiro dos deputados. Elas receberam R$ 7,5 milhões de janeiro de 2015 até maio deste ano.
Vinte e cinco notas emitidas para três deputados aparecem em um imóvel na rua das Gralhas, em Marília, no interior de São Paulo. Mas lá não funciona nenhuma gráfica. No endereço fica a casa de Marco Antônio Dávila Alves, que emitiu as notas como microempresa.
De acordo com Alves, desde 2000 eles terceirizam o serviço e fazem a impressão em Bauru. A mulher de Marco é vereadora na Câmara Municipal de Marília. Alves não passou o endereço onde são produzidos os jornais informativos.
O advogado Adib Kassouf Sad, especialista em contas públicas, explica que esse é o tipo de serviço não pode ser sub-contratado. “Uma gráfica que já não existe em tese não pode ser contratada pelo poder público”.
Mais de R$ 286 mil gastos desde 2015
Nos últimos três anos, o deputado Abelardo Camarinha, do PSB, foi o que mais pagou a Marco Antonio ALves: R$ 257 mil reais. Outros R$ 30 mil foram pagos pelo suplente dele, Airton Garcia e por Júnior Aprillanti, também do PSB.
Na Grande São Paulo, os endereços registrados em nome de outras oito gráficas foram procurados. Na rua Olga de Souza Queirós, Zona Norte, funcionaria a Phoenix Acabamentos Gráficos.
No galpão, o SP1 encontrou uma empreiteira e os vizinhos contaram que a gráfica saiu do local há seis meses. Notas fiscais foram encontradas no endereço depois da data. A Phoenix Acabamentos Gráficos recebeu mais de R$ 246.979,10 do deputado Wellington Moura, do PRB, nesta legislatura.
Outro endereço na Zona Sul de São Paulo consta como endereço da FSC Serviços Gráficos Eireli. A nota foi emitida em janeiro de 2018. A gráfica em tese deveria funcionar no endereço, mas não.
A FSC – Serviços Gráficos recebeu do deputado Teonílio Barba, do PT, quase R$ 195 mil. As duas gráficas para a quais a deputada Ana do Carmo do PT repassou R$ 319 mil nesse período foram procuradas. Só que o endereço é um prédio residencial na Mooca, na Zona Leste.
O professor da Faculdade de Administração da USP Ariovaldo dos Santos, que chefia os cursos de contabilidade, diz que essa situação é irregular. “O material impresso que sai ele deve ser acompanhado de uma nota fiscal que acompanhe que obviamente acompanhe o material e do local de onde está sendo produzido.”
Notas com numeração senquencial e mesmo valor
Ainda na Zona Leste, fomos até outro endereço: o da Abral Gráfica e Editora, que de fato existe. A dona da gráfica confirma que eles prestam serviços para alguns deputados.
De janeiro de 2015 a janeiro de 2018 todas as notas fiscais eletrônicas emitidas pela gráfica foram sequenciais em nome de três deputados: delegado Olim do PP, Clélia Gomes do Avante e Adilson Rossi do PSB. Aliás, a gráfica pertence aos pais de um funcionário de Adílson Rossi.
As notas têm numerações sequenciais e todas também têm o mesmo valor, R$ 8.004 – o total da verba que cada deputado pode gastar por mês com esse serviço.
“Você sequer teve um aumento dos preços, quer dizer, nesses preços você pega por exemplo as gráficas elas têm funcionários, esses funcionários tiveram aumentos coletivos certamente, os salários foram aumentados, e obviamente alguma suspeita levanta não me parece que sejam corretas essas notas”, opina o professor Ariovaldo.
Deputado contrata gráfica do cunhado da irmã
O SP1 também foi atrás da fábrica Sete Gráfica e Editora que recebeu R$ 295 mil na atual legislatura do deputado Enio Tatto do PT.
A gráfica, que funciona na Zona Leste, emitiu desde 2015 notas também para os irmãos dele, os vereadores Arselino e Jair Tatto e o deputado federal Nilto Tatto.
Juntos, contrataram os serviços da gráfica mais de setenta vezes. A gráfica foi fundada pelo cunhado dos irmãos Tatto.
O que dizem os citados
Abelardo Camarinha, do PSB, que usou a gráfica de Marília, disse que os boletins foram impressos e distribuídos para mais de 80 cidades, e que todas as notas foram submetidas ao Núcleo de Fiscalização da Alesp.
Júnior Aprillanti, também do PSB, que usou a mesma gráfica, hoje é secretário de Turismo do estado. Ele disse que a gráfica chegou por meio de recomendação, mas não soube dizer de quem, e que dispensou o serviço porque o resultado era ruim.
Wellington Moura, do PRB, disse que a gráfica Phoenix foi recomendada por pessoas ligadas à campanha dele, e que ela está em outro endereço porque o cadastro na junta comercial está desatualizado.
O deputado Ênio Tatto, do PT, disse que todas as prestações de contas sobre os gastos com material gráficos foram submetidos à criteriosa avaliação do departamento de fiscalização da Assembleia. Sobre o fato de a gráfica ser do cunhado da irmã dele, Tatto disse que o critério de escolha foi a qualidade, a redução do custo e o respeito ao dinheiro público. Os outros deputados citados não retornaram os contatos da reportagem.
Fonte: Portal G1
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