
Artigo do Advogado Dr. André Nogueira – FTN Advogados Associados

No último dia 17 de setembro, a Câmara dos Deputados, por 354 votos a favor e 134 contra, aprovou a chamada PEC da Blindagem ou, na expressão que a própria Câmara tem usado, a PEC das Prerrogativas. É uma questão de ponto de vista. O Projeto de Emenda Constitucional vai ao Senado onde deve ser votado e, esperamos, siga como sendo um mero projeto, um devaneio, que o Senado pode barrar. A PEC é uma manifestação do que denominamos de efeito backlash, uma reação legislativa frente a uma postura indesejado do Judiciário (mas aqui, o backlash nem se volta a atacar diretamente uma decisão específica, mas sim um comportamento do STF, ao menos ao que se indica pelo movimento político ante o julgamento do ex-Presidente e outros projetos, como o da Anistia).
É importante frisar que a PEC fora aprovada com votos das mais diversas bancadas, de alho a bugalho, inclusive aquelas que, em público, se digladiam, como o PL (partido do ex-Presidente, Jair Bolsonaro, com forte adesão de sua bancada) e o PT (partido do atual Presidente, Lula), ou seja, quando o texto é corporativista as ideologias são deixadas de lado para atender interesses de grupo, de partido, da classe política (e esse não é o primeiro exemplo, basta lembrarmos de quando aqui tive a oportunidade de falar sobre a PEC que aumentou o número de deputados), nem sempre e nem necessariamente alinhados aos interesses da população; aliás, uma Câmara dos Deputados fraca, pouco atuante em face dos verdadeiros problemas nacionais e com um número impressionante de parlamentares muito preocupados em “mitar” nas redes sociais com seus grupos de apoiadores e suas bolhas, ao invés de produzir algo verdadeiramente relevante para nossa sociedade.
Mas, voltando à PEC, para os Deputados que a defendem, ela garante a independência do Legislativo em face do Judiciário (leia-se, do Supremo) que, para processar legisladores passaria a ter que superar novos entraves constitucionais especialmente desenhados para dificultar tal possibilidade; na prática, tais processos somente se efetivarão se o parlamentar estiver muito desprovido de apoio político de seus pares.
Isso porque a PEC, que volta à redação originária da Constituição de 88 (promulgada ainda com o receio do período da ditadura militar e, por isso, com forte proteção aos parlamentares, o que não parece se justificar nos dias atuais) prevê que, para se processar o parlamentar, ainda que por crime comum, há necessidade de autorização, por maioria absoluta da Casa Legislativa a que o parlamentar está vinculado (Câmara dos Deputados ou Senado Federal), em votação secreta, num prazo de 90 dias, contados a partir do recebimento da ordem emitida pelo Supremo. O texto é tão corporativista que é mais benéfico do que o da redação original da CF/88, que previa maioria simples e nem prazo para votação. A PEC também prevê que pode não haver suspensão da prescrição para apuração do crime no período em que o parlamentar estiver no mandato. Essa mesma votação e quórum se repetem até mesmo para casos de prisão em flagrante, onde a Casa deve ou não autorizar essa prisão e a formação da culpa, além de criar restrições a medidas cautelares impostas em favor de Deputados ou Senadores.
Mesmo que nesse pouco espaço destinado à essa breve explicação, é fácil notar que a PEC é um aglomerado de favores e benesses constitucionais dadas pelos parlamentares a eles próprios, independe do espectro político, e é lindo como a união e o diálogo entre eles, para se auto tutelarem, funciona bem, oxalá fosse assim nas pautas de verdadeiro interesse nacional; é como se nós nos auto presenteássemos com um pacote etiquetado escrito “prerrogativas”, nome que eles usam. Aos meus olhos e tenho impressão que para boa parte das pessoas, isso é só blindagem mesmo!
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