
Em reunião extraordinária do Conselho de Curso, faculdade emite nota defendendo que a proposta da ABEM seja considerada na construção das novas DCNs

OConselho de Curso de Graduação em Medicina (CCGM) da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB/UNESP) realizou na manhã desta terça-feira, 18 de março, reunião extraordinária e aberta à comunidade acadêmica para discutir em caráter de urgência, o conteúdo da Proposta das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) dos Cursos de Graduação em Medicina, colocada sob consulta pública pelo Conselho Nacional de Educação (CNE).
Os participantes do encontro manifestaram surpresa e indignação com o fato do documento submetido à consulta pública não estar alinhado ao amplo processo de discussão e construção das novas DCNs, desenvolvido ao longo do último ano com a participação de docentes, gestores, estudantes e instituições envolvidas com a educação médica, numa ação conjunta da Associação Brasileira de Educação Médica (ABEM), Ministério da Saúde (MS) e Ministério da Educação (MEC), com o apoio financeiro da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS).
“Fomos surpreendidos de forma negativa já que a proposta apresentada para consulta pública desconsidera todo esse trabalho que teve participação direta da FMB e de uma quantidade enorme de escolas médicas de todo o Brasil. Além de não levar em conta esse processo democrático, o que está sendo proposto representa um retrocesso diante do que vinha sendo apresentado nas DCNs dos últimos 25 anos para os cursos de medicina”, afirma o professor Pedro Luiz Toledo de Arruda Lourenção, vice-diretor da FMB.
A partir de amplos debates, que reuniu órgãos governamentais e da sociedade civil, em oficinas nacionais e regionais foi elaborado um documento contendo sugestões para o texto das novas DCNs para a graduação em medicina no Brasil, posteriormente discutido e validado no 62º Congresso Brasileiro de Educação Médica (Cobem), realizado em Belo Horizonte, em setembro de 2024. A proposta foi encaminhada formalmente ao CNE no início de outubro de 2024.
Em nota, o Conselho Diretor da Abem manifestou sua insatisfação com a proposta apresentada pelo CNE. “Hoje ficou claro que o documento colocado sob consulta apresenta uma construção de forma, conceitos e conteúdos bastante distante do proposto pela Abem”, diz o texto.
“O conteúdo é bastante questionável. Vai na contramão da proposta de formação do profissional de medicina orientada pelas DCNs vigentes, datadas do ano de 2014, e que buscam o perfil do egresso para o trabalho no SUS e atendimento da população brasileira. Essa proposta do Conselho desconsidera esse perfil e, dentre outros aspectos, busca um profissional que passaria a ser formado mais centrado na doença do que no processo de construção de saúde. Isso, inclusive, se contrapõe ao currículo vigente em nossa faculdade”, adverte Lourenção.
O Prof. Dr. Roberto Antonio de Araujo Costa, coordenador do Conselho de Curso de Graduação em Medicina da FMB, também manifestou surpresa e indignação com a posição do CNE. “A gente esperava que o Conselho Nacional de Educação valorizasse o trabalho de praticamente um ano de intensa discussão com os maiores especialistas em educação médica do país, preocupados e comprometidos com a educação e o próprio SUS. E o que a gente vê é que esse trabalho não foi valorizado”.
Na sua visão, o documento levado à consulta pública está muito distante – na forma e no conteúdo – da proposta formulada pela Abem. “Ficamos muito preocupados por serem conceitos que não estão muito bem amarrados e com a epidemia de instituições privadas de medicina abre-se espaço para distorções que em nada contribuem para a melhora a educação médica no país”.
Em votação, os participantes da reunião manifestaram-se contrários à proposta apresentada pelo CNE e decidiram elaborar uma nota oficial para tornar público o posicionamento da FMB/UNESP. Confira abaixo, a íntegra do texto:
“Em Reunião Extraordinária Aberta do Conselho de Curso de Graduação em Medicina (CCGM), realizada no dia 18 de março de 2025, com a participação da comunidade acadêmica, a Faculdade
de Medicina de Botucatu (FMB/UNESP), historicamente comprometida com os processos democráticos de ensino e com a formação médica de qualidade para o Sistema Único de Saúde (SUS), manifesta-se contrária ao documento em consulta pública elaborado pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) para a atualização das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) do Curso de Medicina, considerando que:
1. A elaboração da proposta em consulta pública desconsidera o amplo processo democrático de construção das DCNs, desenvolvido pela Associação Brasileira de Educação Médica (ABEM), pelo Ministério da Saúde (MS) e pelo Ministério da Educação (MEC), com o apoio financeiro da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS).
2. O documento em consulta pública apresenta um conteúdo reducionista, que retrocede em relação aos avanços alcançados na Educação Médica Nacional nos últimos 25 anos. Além disso, enfraquece a formação generalista voltada para as necessidades da população brasileira e para o SUS, ao propor uma abordagem centrada na doença, desconsiderando a lógica da organização do sistema de saúde brasileiro.
3. Há confusão conceitual entre termos como conteúdos, componentes curriculares, habilidades e competências, além da desconsideração de aspectos relacionados à determinação social do processo saúde-doença, e dos eixos de competência em gestão e educação em saúde.
Como uma Instituição de Ensino Superior Pública Estadual, comprometida com o SUS e que participou ativamente do processo de construção das propostas junto à ABEM, a Faculdade de Medicina de Botucatu/UNESP, manifesta-se contrária ao documento em consulta pública e reforça a necessidade de que a proposta da ABEM seja considerada na construção das novas DCNs”.
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