Botucatu tem ‘fábrica’ de embalagens comestíveis

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Botucatu tem ‘fábrica’ de embalagens comestíveis 12 junho 2016
Pazinha pode ser aromatizada com canela, chocolate e orégano

Cerca de um terço do lixo doméstico é de embalagens. Elas têm um ciclo muito rápido, porque  envolve uma mercadoria e é descartada assim que o produto é usado. O mesmo não acontece quando essa embalagem ganha o meio ambiente. Dependendo do material pode demorar até 400 anos para degradar. O desafio atual dos profissionais voltados para a saúde do meio ambiente é buscar materiais que tornem as embalagens atrativas e, ao mesmo tempo, limpas. Ou seja, que degradem rapidamente sem provocar danos ao meio.

Pesquisas e estudos desenvolvidas há mais de uma década pela Unesp de Botucatu começam a ganhar forma com uma nova proposta. Degradação mais rápida ou mesmo de serem comestíveis. O projeto está em andamento na cidade de Botucatu por meio da OKA Bioembalagens. Ainda em pequena escala, as embalagens têm custo mais alto do que as confeccionadas em material plástico, por exemplo. Porém, o plástico demora até 400 anos para degradar, enquanto que a bioembalagem, de 100 a 400 horas.

“Depende da umidade do local onde a embalagem for descartada. Se o descarte for em local seco, vai demorar mais. Se, em lugar úmido, vai degradar rapidamente. Se ela for enterrada, mais rápido ainda. É um produto voltado para produtos ecológicos, orgânicos ou de tecnologia verde. No Brasil há escassez de possibilidades. Temos produtos ecológicos em embalagens convencionais”, explica a design Érika Cezarine Cardoso.

Segundo ela, o mercado não oferece embalagens coerentes com o produto. E em muitos casos o produto é de ciclo rápido, mas a embalagem leva até 400 anos para degradar na natureza. “Fora do Brasil tem mais opções. No país há poucas. No exterior há plástico de milho, de cana. Alternativas de bioembalagens. Tem uma empresa no Brasil, a CB Pack que faz embalagens 90% biodegradáveis, não comestível. O empresário que a montou manteve contato conosco em 2001. Porém, o projeto dele é focado em copinhos de café e água. Ele impermeabilizou e o produto não é 100% biodegradável.”

Segundo a design, apesar das duas empresas usarem a mandioca como matéria prima, a empresa de Botucatu é focada no designer. “Trabalhamos com a personalização da marca, cor, relevo da peça. Nosso foco é de designer. Podemos adaptar conforme a necessidade do cliente. Alguns produtos podem inclusive receber sabor tanto doce como salgado. A pazinha por exemplo, pode ser aromatizada com canela, chocolate, orégano. Depois de usada, ela pode ser degustada.”

Para se ter uma ideia a importância de embalagens biodegradáveis é preciso observar o tempo que cada material demora para se decompor na natureza.  As embalagens de vidro estão no pódio dos mais demorados. Leva até  quatro milhão de anos. O vidro é tão resistente que arqueólogos encontraram utensílios de vidro do ano 2000 a.C. Por ser composto de areia, sódio, cal e vários aditivos, os micro-organismos não conseguem comê-los.

Biomassa é usada para fazer marmita

A pazinha para sorvete, por exemplo, é usada para consumir um alimento e, ao final, pode ser degustada, composta ou até servir de ração animal

Foto: Alex Mita
Moldes onde são feitos os produtos com biomassa

Uma marmita que, após a ingestão do alimento, pode ser degustada. Essa é a proposta inovadora que pode revolucionar o mercado e beneficiar a natureza. Uma vez que todos os dias bilhões de embalagens de isopor e alumínio são usadas e descartadas no meio ambiente. Com gosto de biju, a biomassa usada para a confecção das embalagens são feitas a partir da mandioca.

A design Érika Cezarine Cardoso explica que tudo começa com a biomassa de mandioca. “É a mandioca de fecularia. Pode ser a farinha ou fécula. Nós usamos a fécula pura. A mesma utilizada na indústria alimentícia, farmacêutica e cosmética. A base da nossa biomassa é fécula e água. Pode acrescentar fibras naturais diversas que são resíduos agroindustriais. Pode ser a própria casca da mandioca ou fibra de coco, bambu, de cana, eucalipto, arroz. Enfim qualquer resíduo agroindustrial pode ser adicionado na massa, aumentando a resistência mecânica. Deixando a peça mais rústica e reduzindo custo”, explica a design.

A embalagem, depois de usada, pode ser degustada, compostada ou servir de ração animal. “É 100% biodegradável e biocompatível. Pode cair em qualquer bioma que ela é limpa. Não demora como um plástico. Se dissolve por si só. Nossa embalagem é para consumo imediato. Você serve o alimento e pode consumir a embalagem. Opção para eventos. A pazinha, por exemplo, é usada para consumir um alimento e no fim pode ser degustada. Ela pode ser aromatizada com baunilha, canela ou com orégano. Pode aromatizar com salgado ou doce, depende da utilização dela”, ressalta Érika.

A embalagem de biomassa não serve para armazenamento. “Porque essa embalagem retém umidade e vai deformando com o tempo. Pode chegar até a desmanchar ou endurecer de novo, porém deformada. É própria para consumo imediato. Pode ser usada até para assar um bolo. Após consumir o bolo, degusta a forma. Na verdade temos uma preocupação de transportar a embalagem de forma limpa, sem contato com impurezas.”

O mercado, segundo a design, busca embalagens desse tipo para alimento, porém outras áreas podem usar. “Estamos desenvolvendo principalmente embalagens para alimentos. Ainda temos algumas limitações. Estamos prontos para embalagens que são berços ou estojos para um produto tipo um eletroeletrônico ou cosmético. A embalagem de biomassa pode ser jogada em um terreno que sozinho ela se decompõe. Ela vai servir de alimento para a terra. Se for degustada por um animal, vai ser aproveitada como alimento,” diz.

O mercado que a empresa está galgando é voltado para o empresariado mais consciente do seu papel na sociedade. “Principalmente as empresas que já têm a consciência, tem um produto diferenciado, já trabalha com orgânicos ou produtos sustentáveis de alguma forma. Eles estão buscando realmente embalagem coerente. Mas é para qualquer empresa porque agrega valor.”

Única máquina

Uma injetora que não existe no mundo. Foi criada especialmente para atender as necessidades da empresa de bioembalagens. “Nós desenvolvemos essa tecnologia. Essa máquina foi feita em 2002. Uma injetorinha. Em 2013 abrimos empresa e até 2014 construímos a injetora em escala industrial. É um equipamento diferenciado. A massa vem fria e é expandida num molde quente. Na injetora plástica, o material vem quente, derretido e esfria no molde”, explica a design Érika Cardoso.

Segundo ela, a fabricação ainda é em pequena escala. “Estamos desenvolvendo um novo molde para a máquina de grande escala, a partir da demanda que nós recebemos do mercado. Estamos fazendo pratinhos para festas, eventos. Inclusive um pratinho se encaixa no mesmo pratinho e forma uma espécie de marmita para transporte. Aí vamos retomar a máquina em alta escala. Nesse momento a gente está só com a pequena e está sendo feita outra máquina intermediária.”

Ela comenta que a empresa está em uma fase que mescla vendas para feiras e eventos. São pedidos esporádicos. Isso começou agora em 2016. Estamos com três contratos para clientes específicos que ainda estão testando o mercado. É uma escala bem inicial de teste de mercado. A produção em pequena escala encarece o produto. Uma caixa de ovos jumbo de biomassa pode chegar ao triplo do preço da caixa de papelão.”

A boa notícia é que em pouco tempo esse produto vai chegar no preço dos produtos plásticos. “Porque a matéria prima é mais barata e o processo é muito simples. A questão é escalar isso. Nosso desafio é ter um equipamento, uma máquina rotativa projetada que quando a gente tiver nesse estágio ter um preço bem competitivo como do isopor, por exemplo.”

Uma caixa de ovos com semente de manjericão

Foto: Alex Mita

Uma embalagem para ovos gigantes com rótulo de sementes de manjericão. Essa é a novidade que a Oka levou para a 12ª Feira de Alimentação Saudável, Suplementos, Produtos Naturais e Saúde que aconteceu em São Paulo.

“A nossa proposta é ter um rótulo com papel semente. Esse papel vira um semente de manjericão para o consumidor colocar na sua cozinha. Quando a gente começar a aumentar a escala, vamos fazer uma parte fechada. Esse molde que estamos usando ainda é todo aberto. Mas a parte de baixo vai ser fechada. Vai ser um vaso para você plantar essa semente. Depois esse vaso vai direto para a terra. Ele vai se decompor e a planta ficará na terra.”

A caixa de ovos para seis unidades é do tipo jumbo. “Compro os ovos e os uso. O ideal seria compostar na sua casa. Pode ser colocado junto com o resto de alimento orgânico e virar adubo. Mas o consumidor pode moer e dar para um animal comer, junto com a ração animal. Ele é alimento. Um cão pode comer. Se for uma área rural pode dar para o gado.”

Ela explica que na biomassa pode ser acrescentado a casca de coco que não pode ser digerida pelas pessoas, mas pelos animais. “Se acrescentarmos casca de mandioca, as pessoas podem comer. Nossos produtos são esterilizados a mais de 200 graus.”

Da matéria prima ao descarte

Uma das embalagens da Oka é um desenho de uma oca. Tem um gráfico que tem os três ciclos: da matéria prima, da produção e do mercado. Quando eles se interagem, fecha se o ciclo. Eles chamam do berço ao berço. Da planta até o descarte é um produto limpo. “Usamos isso para ter um produto com a nossa cara. Fizemos um estojinho com tampa. No final do ano, usamos como porta velas para demonstrar o produto. Criamos uma biovela com embalagens de mandioca. Essa embalagem pode ser usada para sorvete, chocolate. Ela é térmica também”, explica Érika Cardoso, sócia da empresa.

Embalagem é 100% biodegradável

Estudo da Unesp de Botucatu de usar a fécula de mandioca em película para impermeabilizar fruta viabilizou projeto para produzir material descartável 

Foto: Alex Mita
Uso da fécula da mandioca foi um avanço para fazer embalagens

A biomassa que hoje serve para fazer as embalagens 100% biodegradáveis foi descoberta há 15 anos, segundo a Oka Bioembalagens. À época a doutora Marney Cereda, então diretora do Cerat da Unesp de Botucatu, se dedicava a estudos de uso da mandioca como filme para impermeabilizar frutas. Buscou apoio tecnológico para aplicação de fécula de mandioca para a produção de embalagens, firmando parceria com especialistas em compósitos e modelagem para desenvolver as primeiras peças para aplicação desse material no mercado. Forma-se uma empresa na incubadora.

“O Cerat é um Centro de Raízes Tropicais de Botucatu. A pesquisadora estudava os filmes biodegradáveis. Estudando as propriedades da mandioca ela percebeu que se tivesse um molde fechado em alta temperatura a fécula expandia. Como ela tem alto poder de aglutinação de expansão, ela toma formato do molde. Entendendo isso ela quis fazer uma experiência. Eles foram para uma incubadora tecnológica. Ela chamou alguns técnicos que desenvolveram moldes ferramentais para transformar isso num produto.”

Várias etapas foram vencidas e em 2002 Érika Cezarine Cardoso, representando sua empresa a Desígnio ecodesign, desenvolve o projeto Siclo – moeda da reciclagem, de gestão de resíduos sólidos, utilizando as bioembalagens em coletores modulares para as versões lixo compostável, sanitário e tóxico (hospitalar), conquistou premiação no concurso Ecodesign da Fiesp.

“Sempre pesquisei novos materiais. Entrei em contato com essa pesquisa e virei parceira. Acompanhei um pouco a distância por quase uma década.  Desenvolvendo projetos, pensando em mercado, trazendo investidores”, contou Érika.

Em 2003, a empresa incubadora se desfaz e os pesquisadores focaram na pesquisa do filme de mandioca. Os técnicos buscam implantação da tecnologia das bioembalagens no mercado. Os anos de 2004 a 2010 foram muito produtivos no aprimoramento do material, gerando variados produtos, formulações e foi depositada uma nova patente, com extensão para o mercado europeu, adicionado fibras naturais (resíduo) a fécula.

“Foi um avanço incorporar fibras naturais. Gerou um produto um pouco diferente. Estamos com um grupo de pesquisadores para conseguir a impermeabilização. Nosso produto não é impermeabilizado. São coloridos com corantes alimentícios, bem naturais.”

O projeto Stock, caixa para calçados recebe menção honrosa no concurso Ecodesign da Fiesp em 2004. Em 2009, a design Érika Cardoso conhece a metodologia do Dragon Dreaming e traz uma nova perspectiva de modelo de negócios e, em 2012, o grupo volta a se reunir para rever o sonho.

Há três anos, nasceu a Oka Bioembalagens como P&D formada por cinco sócios. No primeiro ano é desenvolvida a primeira bioinjetora linear para produção em escala industrial. Apenas em 2015 é liberada a inscrição estadual e licença de operação da empresa e finalmente em 2016 a empresa inicia as atividades.

As embalagens são feitas da biomassa da fécula da mandioca se transformando em fibra com design atrativo em variadas formas e biodegradáveis, o que é bom para o meio ambiente

Fonte: JCNET

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