Botânico explica a segurança alimentar e nutricional

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Botânico explica a segurança alimentar e nutricional 29 julho 2015

Titular da Faculdade de Ciências Agronômicas (FCA) da Unesp, Câmpus de Botucatu., o professor Lin Chau Ming é um pesquisador focado em plantas medicinais e etnobotânica (estudo da relação entre os humanos e as plantas que utilizam). Realizou pós-doutorado em Botânica no Jardim Botânico de Nova Iorque (1998-99) e em Etnobotânica na Columbia University (2007-2009).

Foi editor chefe da Revista Brasileira de Plantas Medicinais de 1998 a 2012. Além de livros técnicos e científicos na área de agricultura, publicou neste ano de 2015, em comemoração aos 50 anos da FCA,  “Seringas, seringueiras e seringueiros”, sobre as experiências vividas no Acre; e “As vendedoras de hortaliças de Shangai”.

Em entrevista ao Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais (IPPRI -Unesp) Ming explana sobre a importância da Agroecologia para a política de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN).

 

Poderia explicar o conceito de Agroecologia?

– Talvez haja alguma divergência teórica e mesmo ideológica sobre agroecologia ou práticas agroecológicas. De forma ampla, Agroecologia é uma ciência que valoriza o trabalho do agricultor na produção de alimentos e, além disso, une elementos das áreas de Ecologia e Meio Ambiente. Na Agroecologia podemos utilizar diferentes insumos naturais e diferentes tecnologias com o intuito de construir as bases da agricultura “sustentável”. Na minha opinião, o consumidor de produtos agroecológicos das grandes cidades não considera o fator humano nessa produção, embora ele pense em um tipo de plantação ambientalmente correta. 

 

Desde 1998 o senhor coordena o Grupo Timbó de Agroecologia, da FCA. Nesse período, quais foram as conquistas do Grupo?

 – O Timbó é constituído por uma minoria dentre os estudantes. No entanto, pouco a pouco estamos conquistando espaço pela realização de atividades de Extensão, não somente de mostrar como são as práticas naturais de produção de alimentos e de lidar com os agricultores, mas também de fazer experiências científicas. Experiências agronômicas, mostrando uma outra ideia de como poderia ser a prática agrícola sem utilizar produtos químicos. Então, trabalhamos para manter viva a ideia da Agroecologia e da produção de alimentos preservando o ambiente e, acima de tudo, dando suporte à parte humana desse negócio – os agricultores. Buscamos saber quais são os anseios desses agricultores, discutir com eles as demandas locais, em lugar de levar demandas. No Timbó temos alunos de Biologia, Zootecnia, Agronomia e Zoologia. Procuramos envolvê-los nas experiências de campo, atendendo as demandas dos lavradores.

 

O senhor também desenvolve um trabalho de Extensão pelo qual promove transferência de tecnologia agroecológica para o agricultor familiar em comunidades remanescentes de quilombos em Iporanga (SP). Como é essa atividade?

– Trabalhamos com esses remanescentes desde 1997. Aos finais de semana levamos os estudantes para Iporanga, onde podem vivenciar o cotidiano do agricultor familiar. Então eles observam a parte agrícola, a de artesanato, os recursos da floresta, plantas medicinais, quer dizer, coisas que são diferentes do agronegócio. Além disso, transferimos conhecimento de técnicas agroecológicas, inclusive criamos um manual sobre o assunto. Essas viagens são justamente para apoiar agricultores da região. Um fator comum entre eles é que nem todos são agroecológicos. Aliás, a maioria não é. Nossa grande demanda é fazer essa transição, de uma agricultura familiar com bases não agroecológicas para uma com bases agroecológicas. Isso é uma ação muito difícil. O agricultor faz daquele jeito há 20 ou 30 anos. Durante nosso período em Iporanga observamos mudanças nas práticas dos agricultores com os quais tivemos contatos. Esses, por sua vez, transferem as informações, ainda que de forma lenta, para outros, por intermédio dos mutirões. Como o setor dominante é muito forte, acredito que nossa ação tem uma abrangência mais restrita. 

 

No Estado de Mato Grosso o senhor coordena uma atividade de extensão junto a etnias indígenas. O que está sendo feito por lá?

– Desenvolvo com alunos, desde 2006, um projeto de resgate e reintrodução de material genético alimentício, particularmente o milho. A etnia Pareci, em Mato Grosso, produz uma variedade de milho “fofo”, da qual se extrai um tipo diferente de amido. A importância dessa variedade de milho para os indígenas não é somente alimentícia. Mas também cultural. De garantia de alguns rituais sagrados daquelas comunidades. Lá entre os Pareci, antes de abrir uma área para fazer agricultura, eles pedem autorização para algumas de suas santidades. Então eles fazem os rituais de oferecimento com uma espécie de mingau feito com o milho “fofo”. Não pode ser usada outra variedade. Como o milho “fofo” estava em extinção, os Pareci deixaram de fazer o ritual de oferecimento. Para conseguir sementes dessa variedade fizemos expedições em outras etnias. Atualmente cerca de 20 aldeias voltaram a cultivá-lo. E voltaram também a fazer os rituais. Então, Segurança Alimentar inclui aspectos culturais e antropológicos.

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